podcast Foro de Teresina 94, o número real de contaminados pode ser até dez ou onze vezes o que vemos no noticiário. O fato é que as coisas mudaram para todo o mundo, que o ano para a economia já acabou, que vamos ter que nos reinventar praticamente do zero. E que as pessoas vão morrer e que existem pessoas com história de verdade atrás dos números.
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É incerto onde a morte nos espera, aguardemo-la em toda parte. Meditar previamente sobre a morte é meditar previamente sobre a liberdade. Quem aprendeu a morrer desaprendeu a se subjugar. Não há nenhum mal na vida para aquele que bem compreendeu que a privação da vida não é um mal. Saber morrer liberta-nos de toda sujeição e imposição. de Montaigne, Michel. Os ensaios: Uma seleção (Locais do Kindle 737–739). Penguin-Companhia. Edição do Kindle.
Tenho tido sonhos lúcidos. Neles, vividamente, observo os acontecimentos, muitas vezes envolventes onde sempre há uma lição a se aprender. Sei que são lúcidos por que eu sinto que estou aprendendo algo ali. Que eu faça parte da encenação e dance conforme a música fala mais sobre minha maneira de ver a vida do que sobre a natureza do sonho. Para mim a vida é como um teatro, uma grande encenação, uma imensa alegoria cujo sentido está sempre exposto e por isso é tão pouco percebido. Não é original, Shakespeare já pensava assim, mas é como eu me sinto.
Se a vida não passa de um sonho, os sonhos lúcidos são meta-encenações e por isso mesmo eu engajo neles com um senso maior de desprendimento — continuarei sonhando quando acordar. Porém, em momentos como o que vivemos, é grande a sensação de participação de algo maior, mais real e até adventício. Epidemias são comuns na história humana desde antes de criarmos civilizações (como aponta esse excelente podcast do Mizanzuk, com Tupa Guerra e Filipe Figueiredo), e são momentos ricos na nossa história por que nos lembra, coletivamente, de nossa condição essencial nessa vida: de que vamos todos morrer um dia.
Se pudéssemos apresentar a cada um a conta dos anos futuros, da mesma forma que se faz com os que já passaram, como tremeriam aqueles que vissem restar-lhes poucos anos e como os economizariam! Pois, se é fácil administrar o que, embora pouco, é certo, deve-se conservar com muito cuidado o que não se pode saber quando acabará. Sêneca. Sobre a brevidade da vida . L&PM Editores. Edição do Kindle.
Não à toa as vendas da alegoria existencial A Peste de Camus aumentaram significativamente; as pessoas passam a questionar a natureza da própria existência em épocas como essa. Que o hábito permaneça mesmo depois da crise é uma coisa que tenho torcido do fundo do coração. Eu mesmo nunca li essa obra, e tenho tido imensas dificuldades para ler qualquer coisa; recentemente voltei a beber, visto que as vantagens de não-beber estavam perfeitamente delineadas — mas que não era muito conveniente em tempos de isolamento. Em casa, de férias, descobri que ter o dia todo livre para fazer as coisas que estavam na minha bucket list não é suficiente; no equilíbrio entre o autodesenvolvimento e a estima pelos meus iguais eu sempre pendo para a estima.
Não que sejam coisas opostas; não são. Mas, outra vez, a sensação de algo grandioso que afeta a tudo e a todos acontecendo neste exato instante faz como que espíritos excitáveis como o meu rapidamente fechem o livro e abram as notícias. Meu problema com produtividade é que só vejo que fui produtivo quando já não sou mais; muitos começos e poucas conclusões me fazem contar quase exclusivamente com o oráculo da noite para realizar minhas mudanças mais íntimas.
Mudança, sim. Porque a mudança não é a inimiga. A mudança não é a responsável pela tristeza, pela perda ou pela falência; a mudança é parte intrínseca da vida e faz parte do pacote que é viver. Só não experimenta a morte quem já morreu, e deste estado não temos, nunca, jamais, ciência alguma.